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quarta-feira, 2 de junho de 2021

MENTIRA VERDADEIRA

Aprendi que a verdade é a versão dos poderosos. Devo isto ao Michel Foucault. A verdade, segundo ele, e talvez outros tenham dito algo parecido a isto, é a versão que o detentor do poder dá aos fatos. Ela se estabelece como verdade porque os fracos não têm o poder de se fazer valer ou ouvir. Por isto (devo isto ao guru Zé Lima), a versão dos fracos e sem poder é “sub-versão”.

Ao estudar história, percebi que a história que conhecemos é a versão dos poderosos. Ela é a feita a partir de manuscritos, cerâmicas, construções, obeliscos, pirâmides, santuários, sarcófagos, túmulos dos poderosos. Os pobres e marginalizados não tinham como deixar construções, manuscritos e sarcófagos. Morriam e eram apagados da história.

Ampliando o conceito, a história é a versão dos poderosos nas suas vitórias contra inimigos derrotados. O derrotado não deixava traços. Eram dizimados. Muitas das inscrições do antigo Egito, Babilônia, Pérsia, Grécia e Roma são relatos de vitoriosos. Um outro pequeno trecho de um derrotado apareceu e pouca importância se deu a eles. Um deles é Šutruk-Naḫḫunte. Ele ganhou, muitos séculos depois, uma projeção mínima no curta-metragem “The Palace Thief”, e a adaptação no “The Emperor's Club”. Era um conquistador egomaníaco famoso em seus dias, mas praticamente desconhecido hoje.

A maior coletânea de história sobre marginalizados e pobres se tem na Bíblia. Em uma sociedade extremamente patriarcal e machista, que o Antigo Testamento traga as histórias de Débora, Sara, Hagar, Bate-Seba é surpreendente e inexplicável. Que seja a história de um povo marginalizado, escravizado e peregrino, é também inexplicável. É a maior coletânea de feitos históricos de pobres e excluídos.

Estamos em tempos de uma CPI que investiga fatos relacionados ao poder e busca identificar atos de omissão e comissão no enfrentamento da pandemia. No que pese a imposição legal de que a testemunha tem o dever de falar a verdade, sob a pena coercitiva da lei, temos assistido a depoentes (Fabio Wajngarten, Queiroga e Pazzuelo) mentindo descaradamente. Tiveram a desfaçatez de negar o que escreveram e disseram, no que pese os textos publicados, os vídeos apresentados e as declarações dadas. O campeão das mentiras foi o general Pazzuelo, amparado que estava por um habeas corpus que o eximia de ser preso pela CPI.

Porque estavam no poder e tem o apoio do governo, tiveram a coragem de mentir em rede nacional, na esperança de que, ao apresentar a versão do poder, estariam estabelecendo a verdade oficial e vitoriosa.

Parece que não perceberam que os tempos são outros, que a mídia social está atuante, que as falas são checadas online com as verdades que a grande imprensa, os meios de comunicação e jornalistas investigativos têm mostrado.

Por não terem a “sua verdade” estabelecida, por terem suas falas contraditas, mostra que quem está no poder não tem o poder. Lendo Gene Sharp entendi que uma coisa é ter o posto, a posição, outra é ter o poder. Este é resultado da obediência que o povo lhe presta.

Só posso concluir que falta poder a quem hoje tem a posição de autoridade nacional. Quem usou e abusou de um texto bíblico sobre a verdade que liberta, labora no erro e na mentira, e crê que pode mudar os fatos com sua versão enviesada.

A verdade liberta, diz o texto jesuânico. Que liberdade há nas 450.000 mortes?

Marcos Inhauser

 

 

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A VERDADE ANTI-ESCRAVIDÃO

Já gastei algumas linhas trabalhando a expressão jesuânica do quarto evangelho de que “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Na última vez, disse que a expressão precisa ser analisada e entendida no seu contexto (o próprio evangelho), onde o tema da vida plena é central. Assim a libertação de que se fala é a libertação para a vida plena.
Quero trabalhar outro aspecto, agora pela via negativa: a mentira escraviza, manipula, trata o outro como incapaz de conhecer e suportar a verdade. Seja qual for o motivo para a sua existência, há da parte do mentiroso motivações manipuladora e escamoteadora. Por causa disto, tanto o mentiroso como o que é vítima dela são escravizados. O primeiro pela própria mentira que deve manter a qualquer custo, o último porque não tem acesso à verdade que liberta, mas se vê enredado nas tramas da manipulação de quem mente.
Tenho pensado nisto diante da avalanche de mentiras contadas e descobertas com a operação Lava Jato.
Ainda que a mentira possa ter dado um certo alívio a quem a contou no início e até certo prazer, o custo de mantê-la e, por fim, vê-la desmascarada, é cruel. Lembro-me de uma frase do Barusco na CPI (um dos poucos que falou neste festival de “reservo-me no direito de permanecer calado”) quando disse mais ou menos isto: num determinado perdi a tranquilidade e o sono por não saber como explicar a montanha de dinheiro que tinha”. A confissão foi alívio porque libertadora.
O imbróglio de mentiras do Cunha e as suas “explicações”, são novas mentiras para sustentar as anteriores. É um escravo das mentiras contadas. A mesma coisa se pode dizer do Delcídio e sua súbita demonstração de espírito solidário com o Cerveró. A versão contada no seu depoimento é tão esfarrapada que acabou se enredando ainda mais no cipoal da escravidão da mentira.
Com isto, quero esclarecer o seguinte paradigma: a mentira escraviza, a verdade liberta. Acrescento: toda verdade é libertadora, ainda que ela tenha seu custo e dor inicial.
Nestes dias, em uma viagem de ônibus, sentou-se ao meu lado uma jovem mãe com sua filha de ano e meio. Depois de mais de uma hora de conversa, ela me contou que, quando tinha 11 anos de idade, surpreendeu sua mãe com um homem na cama. Aquilo para ela foi terrível. Porque sabia que seu pai também não era santo, nunca falou para a mãe o que tinha visto, mas isto a matava por dentro. Há dois anos teve uma conversa com a mãe e contou o ocorrido. No dizer dela: “senti que um peso saiu de mim. Nasceu um riso nos meus lábios, voltei a viver. Eu vivia uma farsa com minha mãe simulando que tudo estava bem e não era verdade. Quando contei a ela o que eu sabia, a relação nossa melhorou e muito”. Uma verdade que a libertou!
Na sucessão de verdades que estão vindo à tona, há um processo de libertação. Creio que estamos sendo libertos de corruptos contumazes, de políticos desonestos, de governantes inescrupulosos, de gurus enfatuados, de marqueteiros manipuladores, de ex-presidentes que mentiram e continuam mentindo.
A verdade nos está libertando!!!
Marcos Inhauser