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quarta-feira, 4 de setembro de 2019

O SÁBIO E O PROFETA


Na cultura grega ser considerado sábio era o ápice. Tal reconhecimento não era fruto de autoproclamação, auto reconhecimento ou petulância de quem assim se arvorasse. Ser sábio era o fruto de longa caminhada no saber e no discernimento das coisas. O sujeito inteligente, ou o que muito sabe, não, necessariamente, era sábio. Por outro lado, o sábio, não necessariamente, precisava ser dotado de acúmulo de saber, mas de percepção clara das coisas, dos fatos, das pessoas.
Trazendo para nossos dias, o sábio não é quem tem um PhD em algo, ou um título de Livre Docência, que tenha escrito muita coisa ou livros. O sábio pode ser alguém que, não tendo caminhado as trilhas do saber acadêmico, entende das coisas, normalmente as comezinhas. Não é um autodidata (que se caracterizam pela arrogância), mas alguém que aprendeu no convívio social, nas interações humanas e nas comunicações ecléticas. No dizer de Gramsci, acho, é o intelectual orgânico.
Na cultura hebraica e na semita, o ápice era ser profeta, no sentido de ser uma pessoa inserida na comunidade e que se compromete com a história. Tanto no sentido hebraico como no grego, a palavra que fala do profeta, não é a do vidente. Ainda que possa haver textos onde a conotação aparece, considerada no seu strictu sensu o profeta é o “que fala da parte de”, é o mensageiro, a pessoa dos recados. Daí porque ocorre com frequência a expressão “veio a mim a palavra do Senhor dizendo”, “vai e dize ao meu povo”, “assim disse o Senhor”
No ambiente hebraico, o profeta era alguém da comunidade, que vivia os dilemas sociais e econômicos dela, e se comprometia com a denúncia dos erros e pecados, especialmente dos dirigentes e governantes. O profeta tinha um compromisso radical com os pobres, viúvas, órfãos, estrangeiros, sujeitos prediletos dos exploradores e governantes injustos. Daí porque, no mais das vezes, a palavra profética é a da denúncia, do juízo sobre esta casta exploradora, sempre em favor dos menos favorecidos. A pregação profética da esperança futura não tem nada de visão, antecipação ou premonição, mas é o desejo genuíno de que haja mudanças na situação. Mais que uma revelação antecipatória é uma aspiração sublimatória do momento presente pela esperança futura.
Colocadas e explicitadas estas coisas, não preciso de muito espaço para afirmar que a relação profeta/reis/governantes/pseudo sacerdotes é espúria. O profeta não se assenta com os escarnecedores, com os exploradores, com os que praticam injustiças. Ele fica de fora destes círculos, dos palácios e só se dirige a eles para denunciar seus pecados e injustiças. Ele também se dirige aos explorados para dizer: vai haver troco, vai haver novos tempos, aguenta que Deus vai virar o jogo! O casamento do profeta com o governante é adultério e promiscuidade. Pior que isto é o governante se apropriar dos símbolos e discursos da religião, para passar a imagem de que seu governo é ungido e que ele faz a vontade de Deus. Quer parecer sábio ao dizer quem é terrivelmente evangélico.
Devemos lembrar que algumas das piores ditaduras que a humanidade conhece e viveu foram ditaduras religiosas, seja em nome de Javé, de Alá, ou outro deus qualquer. O presidente que se acha messias é um risco aos governados. Assim foram Pinochet, Hitler, para citar dois dos mais recentes. O messianismo que acreditavam e sustentavam validava as coisas que faziam. Uma coisa é ter metas no governo, outra é ver isto como missão com tempero religioso e discurso pseudoteológico.
Também acintoso é o governante que vai aos templos e se arvora pregador e recebe benção de sacerdotes que estão sub judice.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 24 de abril de 2013

CONSERVADORISMO

Uma das características das igrejas é a confessionalidade, determinada pelo conjunto de doutrinas que a denominação ou religião estabelece como sendo a verdade. Esta doutrina teórica é ensinada através de Catecismos que são ensinados e que os aprendizes devem memorizar, repetir e recordar. Ora, ao fazer isto, a igreja conserva o mesmo, as mesmas verdades que foram pronunciadas há séculos por algum iluminado, seja Agostinho, Aquino, Lutero, Calvino, Zwinglio, Wesley ou qualquer outro.
A preeminência desta Confissão é tão grande que o Código de Disciplina da Igreja Presbiteriana do Brasil, no Capítulo II, quando trata das faltas, no Art.4º, Parágrafo Único – “Nenhum tribunal eclesiástico poderá considerar como falta, ou admitir como matéria de acusação aquilo que não possa ser provado como tal pela Escritura, segundo a interpretação dos Símbolos da Igreja”. Percebe-se assim que só é falta (pecado) aquilo que é previsto nos Símbolos da Igreja (Confissão de Fé, Catecismos Maior e Menor).
A memória, a recordação preservam o passado e este é imutável. Não se muda o que já aconteceu. Ao fazer esta retro-oculatra, as igrejas perdem o sentido de uma resposta ao presente, preferindo a saudade de tempos idos. A recordação tem algo de opressora: ela não permite a novidade, a descoberta, a criatividade. Ela congela o pensamento e nega o diferente. Ao assim proceder, entroniza o passado como verdade absoluta e demoniza o presente e os sonhos de futuro melhor como demoníacos.
Não é para menos que os profetas tenham sido mortos, torturados, serrados ao meio. No dizer do escritor de Hebreus: “Todos esses morreram cheios de fé. Não receberam as coisas que Deus tinha prometido, mas as viram de longe e ficaram contentes por causa delas, declararam que eram estrangeiros e refugiados, de passagem por este mundo. E aqueles que dizem isso mostram bem claro que estão procurando uma ... Não ficaram pensando em voltar para a terra de onde tinham saído. Se quisessem, teriam a oportunidade de voltar. Mas, pelo contrário, estavam procurando uma pátria melhor, a pátria celestial. E Deus não se envergonha de ser chamado de o Deus deles, porque ele mesmo preparou uma cidade para eles.” (Hb 13:12-16).
Para a religiosidade ortodoxa, ciosa das verdades que sustenta há séculos, os pregadores de alternativas, os promotores de perguntas, os questionadores devem ser liquidados, taxados de hereges, queimados no fogo da Inquisição.
Nada mais fácil que taxar alguém que pensa de herege, apóstata. Não há lugar para os profetas! A função do ministério profético é manter juntos o espírito crítico e a ação. É na dialética entre crítica e ação que nos tornamos fiéis a Deus. Optar por um ou outro é cair nas armadilhas do progressismo e do conservadorismo.
Marcos Inhauser