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quarta-feira, 16 de outubro de 2019

TEOLOGIA ZIRCÔNIO!


Um casal apareceu em casa porque soube que minha filha entendia de pedras preciosas. Eles haviam ganho de um andarilho uma pedra lapidada que brilhava muito. O casal era evangélico, passava por momentos difíceis e acreditaram no milagre da provisão.
Levaram a pedra para algumas pessoas tão leigas quanto eles para que a examinassem e quase todos disseram que havia grande possibilidade de ser um diamante. Olharam os preços de um diamante parecido e a cifra chegava à casa do milhão. Eles nos mostraram a pedra e, confesso, ficamos surpresos com a beleza dela. Chamei minha filha que morava na China e trabalha com pedras preciosas. Ela pediu fotos em vários ângulos, pediu para ver se havia impureza interior, se havia mancha de uma cor que eu não sabia identificar, mas minha esposa e o casal conseguiram ver. Ao final, minha filha pediu para eu soltar a pedra em cima do vidro da mesa. Deveria levantá-la a uns 30 centímetros e soltar.
Assim procedi. Ela me pediu para falar no reservado e foi quando ela sentenciou: “Pelo barulho na batida com o vidro isto é zircônio”. “Você tem certeza?” “O som do diamante é outro”. Argumentei que o som era via WhatsApp e do outro lado do mundo. “É zircônio!” concluiu ela.
No outro dia, minha esposa e o casal foram ver o seu Jozo, um japonês amigo nosso e de nossa filha e que é um dos maiores gemologistas do Brasil. Ele viu a pedra de longe e disse: “não é diamante e, para provar o que digo, vou mostrar alguns testes para vocês acreditarem”. Ele assim fez e provou que era zircônio de péssima qualidade.
Esta história me veio à mente ao ver gente cristã se empolgando com a ondas de “babaquices pseudoteológicas”. Estão achando que encontraram o diamante da teologia e da vida espiritual, que agora têm ao seu alcance a pedra fundamental do entendimento bíblico, que agora sabem a chave hermenêutica para todos os problemas espirituais e sofrimentos humanos, que descobriram o Santo Graal da vida cristã, que têm a pedra teologal. Abraçam as novidades como se diamante fossem. São alertados por quem tem alguma noção da coisa, que trabalha com teologia e eles simplesmente dão de ombros. Acham que a palavra do gemologista da teologia não é válida. Não acreditam que um perito pode identificar pelo barulho que faz. Quem nunca mexeu com gemas teológicas, se julga mais entendido que os gemologistas reconhecidos e respeitados.
A leitura literal e fundamentalista da Bíblia é mais verdadeira que a feita por linguistas especializadas em grego koiné e hebraico bíblico, ambas línguas mortas. Suas “descobertas”, mesmo que não tenham comprovação arqueológica ou sejam refutadas por quem entende das coisas da arqueologia, ainda assim é verdade absoluta. Acabam crendo no demônio da caspa, esquizofrenia, psicopatia, depressão, bipolaridade. Exorcizam obesidade e pobreza!
Mais tarde, quando a decepção vem porque descobrem que fizeram um anel solitário com uma pedra de péssima qualidade, um zircônio de quinta categoria, acusam Deus e o mundo de serem desonestos. Eles se revoltam e, via de regra, deixam a fé e a comunidade de lado. Para não pagar o mico de terem sido surdos às advertências dos gemologistas teológicos, fogem deles como o diabo da cruz. Preferem o zircônio das novidades à credibilidade dos teólogos!
Mas, como dizia um ex-aluno meu, citando Nietsche (duvido que o aforisma seja dele, mas mesmo assim muito válido): “todo palhaço tem sua plateia!” E zircônio vira diamante!
Marcos Inhauser

quarta-feira, 30 de março de 2016

TEOLOGIA EM TEMPOS DE WHATSAPP

Venho assustado com o nível dos comentários feitos às colunas e participações em redes sociais. Falei aqui de um amigo que comentou o filme “Perdido em Marte”, fazendo um paralelo com a parábola do Bom Samaritano. Recebeu duras e vulgares críticas e a ameaça ser detonado em tudo quanto viesse a escrever.
Recebi hoje mais uma pérola destas. Um amigo participava de um grupo do Whatsapp, e o fazia e pela vertente cristã e “evangélica”. Com consciência cidadã, quando recebeu uma mensagem sobre a gripe H1N1 e os cuidados que se pode e deve para não propagá-la, recebeu a seguinte mensagem de um participante do grupo: “Amigos eu acredito que devemos nos prevenir sim, mas cabe aos pastores a luz da Palavra repreender essa peste do ar e ensinar suas ovelhas.  No Salmo 91 está escrito: Praga nenhuma chegará a tua tenda, o Senhor dará ordem aos seus anjos para nos guardar em todoooos os momentos de nossas vidas.  Não podemos esquecer que estamos debaixo da autoridade, governo celestial.  Como disse Jesus, estamos neste mundo mas não fazemos parte dele. Toma posse do Salmo 121.  Tenham todos um dia abençoado.” (sem edição no texto enviado). Ele ainda emendou “O senhor dará ordem aos teus anjos para nos guardar em todos os nossos caminhos, hoje na oração da madrugada eu orei sob essa palavra.”
O meu amigo retrucou: “É verdade. Devemos repreender H1N1, chicungunia, dengue, malária,  câncer, enfarto,  AVC... e virarmos um exército de super homens e super mulheres. E aproveitar e excluir o apóstolo Paulo, que não se submeteu a esta autoridade do governo celestial, passando a vida toda com um espinho na carne e seu discípulo Timóteo, que acho que nem conhecia a Bíblia,  pois tinha um problema de estômago, que seu mentor,  o Paulo, orientou curar com vinho. Convido ainda os amados irmãos a jogarem fora suas carteirinhas do convênio médico e cartões do SUS. Afinal, praga alguma chegará às nossas tendas! Que tal suspender, pela fé, todas as vacinas para crianças filhas de crentes? Afinal, a mesma fé que nos livra do H1N1 nos livra da difteria, tétano, coqueluche, meningite e outras infecções causadas pelo Haemophilus influenzae tipo b, Hepatite B e outras pragas.” Porque já tive problemas com gente que não entendeu se tratar de ironia, aviso: a colocação do meu amigo foi irônica!
Quando recebi estas pérolas e a resposta, lembrei de um desafio que fiz aos milagreiros: “Convoco-vos, ó milagreiros religiosos deste meu Brasil, especialmente os da linhagem evangélica, a unir-vos em uma “Cruzada Nacional de Erradicação da Praga” ou na “Cruzada Nacional de Expulsão do Demônio do Aedes Aegyti”. Convoco-vos pastores, pastoras, profetas, profetisas, bispos, bispas (sic), apóstolos, apóstolas (sic), missionários, missionárias, apocalipsistas e outras classes de agraciados por Deus com o poder da realização de coisas sobrenaturais. ... E para que a glória seja ainda maior, sugiro aos midiáticos Edir Macedo, Silas Malafaia, R.R Soares, Valdemiro Santiago e outros tantos assíduos frequentadores das telas televisivas para que vos apresenteis em rede nacional de televisão, orando com a imposição de vossas mãos sobre um tanque de água com uma multidão de larvas, e peçais em oração, súplica ou clamor (não me importa o nome que venhais a dar), a morte de todas as larvas ali presentes e que esta bênção seja aplicada a todos os demais criadouros espalhados pelo Brasil e, por que não, ao redor do mundo. Desafio-vos ainda a orar pedindo a morte instantânea de todos os mosquitos endemoninhados! Se não for pedir muito, desafio-vos também a orar pela cura de todas as crianças nascidas com microcefalia!”
Há horas que me dá vergonha de ser pastor e também fico santamente irado com este tipo de besteirol religioso.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

A AUTODIVINIZAÇÃO



Se Deus é infinito e incognoscível, conhecê-lo se coloca no campo das possibilidades e das tentativas. É uma ação enquadrada no campo do não-poder, da impossibilidade, que, longe de impedir a busca, se faz no limite da consciência da incapacidade de conhecê-lo em sua plenitude. Quando se tem esta consciência, o conhecimento que se tem passa pelo filtro da lógica e aflora sob o manto da humildade, uma vez que, nunca será o conhecimento absoluto e definitivo. Mais ainda: será o conhecimento aberto às novas buscas e saberes, sabendo que é uma caminhada sem fim, mas que pode estar no rumo certo.
O problema do fundamentalismo de qualquer naipe e religião é que o portador de um “saber” (ainda que não necessariamente errado) entende que o seu conhecimento é absoluto, definitivo, normativo. Confunde o que pode saber sobre Deus com o próprio Deus e a enunciação da verdade que diz possuir tem a aura de ser a vox Dei. Ainda que possa ter passado pelo filtro da lógica, o fundamentalista se caracteriza pela enunciação arrogante de “suas verdades” porque entende que fala o que Deus falaria.
Ao assim proceder tem outra característica no discurso: a ênfase na condenação dos que pensam ou agem diferente do que pensam e agem. Eles não toleram a diferença! Na sua visão, dicotomizam o mundo entre fieis e infiéis, santos e pecadores, justos e injustos. Esta visão maniqueísta, onde tudo é preto ou branco, os cinzas do questionamento, da busca incessante da verdade, a crítica, a pergunta inteligente, a explicitação das incoerências são vistos como obra demoníaca e passível de condenação.
Parece que se alegram com os que são condenados e não com os que são salvos. Cada um que é “condenado” pelas suas ortodoxias é mais um ponto de mérito para os iguais que repetem a mesmice ad eternum.
Aqui se tem outro dado deste comportamento: a novidade é proibida. Os fundamentalistas não podem pensar, só repetir o que há tempos vem sendo dito. Quais papagaios religiosos, sabem umas tantas coisas de memória que as repetem à exaustão e, em um círculo de louvação mútua, se parabenizam pela fidelidade em “re-dizer” as coisas. Assim se tem um comportamento bipolar: louvam-se mutuamente e execram os dissidentes ou diferentes. Haja espírito de corpo (ou de porco?) para que se retroalimentem infinitamente.
Um amigo que não é liberal, mas que pensa, ao fazer uma análise do filme Perdido em Marte em paralelo com a parábola do Bom Samaritano, foi execrado por xiitas cristãos que declararam guerra santa e prometeram detonar tudo quanto viesse a escrever.
Há uma semana recebi artigo de um pastor indignado com a falta de sensibilidade artística. Uma imagem (bastante decente e sóbria) da Eva comendo uma maçã com uma serpente envolta em seus pés, tinha à sua frente a Maria grávida e ela pisava com seus pés a cabeça da serpente. A celeuma criada foi porque o texto bíblico não fala de maçã como o fruto proibido e porque a promessa bíblica é que Jesus pisaria a serpente e não Maria. Isto era endeusar a Maria! Haja literalismo e burrice artística!
Os que acreditam que o que conhecem sobre Deus é a palavra final, tem, por consequência, a autoridade para julgar e condenar. Conseguem ver nas vírgulas heresia, nas exclamações hedonismo, na valorização do ser humano humanismo. Sem saber o que isto quer dizer, acusam de existencialista, marxista, evolucionista, darwiniano, esquerdista, apóstata, adepto da teologia relacional, etc. Eles assim o fazem porque creem com profunda convicção de falam como se deuses fossem. É a autodivinização só reconhecida por eles e seus pares de louvação mútua!
 Marcos Inhauser

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

PROFUNDOS CONHECEDORES DO INCOGNOSCÍVEL

Fico estarrecido com a facilidade de certos “intindidos de Deus” em fazer ousadas asseverações acerca dEle, como se o conhecessem tão bem quanto a si mesmos. São comuns as frases como: “a vontade de Deus é ...”; ‘o que Deus quer te ensinar é ...”; “Deus vai pesar sua mão sobre você”; “isto é castigo de Deus”; “o que Deus quer é ...”; “Deus vai fazer isto ou aquilo”; “Deus quer te dar uma lição”; “é a mão de Deus que está pesando sobre você”; “Deus vai operar maravilhas hoje”; “o centro da vontade de Deus é ...”; “a família é o projeto do coração de Deus”; “este Deus mandou para o inferno”; etc.
Nos últimos tempos tenho visto ousadia ainda maior. Gente que afirma que “o que Jesus tinha em mente quando falou isto é ...”” Desafio a estes “intindidos” a dizer o que estou pensando enquanto escrevo estas linhas. Se não conseguem precisar isto, como podem se arvorar em detentores do conhecimento da mente de Jesus?
Não só o conteúdo destas frases mostra a arrogância de quem as fala pela pretensão de conhecerem a mente de Deus, mas, e muito mais grave, é a petulância arrogante com que as pronunciam. Usam deste pretenso conhecimento para manipular e se colocar como seres mais próximos de Deus que os simples mortais.
Se, por definição, Deus é o Ser Absoluto, Infinito, Incompreensível, o conhecimento sobre Ele só pode ser tentativo, especulativo e deve ser feito em humildade de quem só sabe que dois mais dois são quatro diante da complexidade de toda a matemática.
Aliado a esta pretensão do conhecimento do que não é possível conhecer na sua integridade, alia-se a preguiça mental dos ouvintes. É mais fácil dar crédito a um imbecil do que avaliar e criticar a mensagem de um pretenso iluminado. Isto me faz lembrar da frase de um amigo de longa data que dizia que “todo palhaço tem sua plateia”. Mas o que mais me assusta é que são estas mentes brilhantes que conseguem entender a totalidade do ser de Deus os que mais plateia tem, sinal inequívoco do que as Escrituras afirmam sobre os últimos tempos: cercar-se-ão de mestres segundo suas cobiças. Mudo a frase: cercar-se-ão de mestres segundo suas preguiças mentais.
Há alguns anos escrevi aqui quatro colunas. Teologia com ponto final, com exclamação, com interrogação e com reticências. Nelas eu já colocava estas minhas preocupações e dizia que a teologia com ponto final é problemática. Diante de Deus posso ficar maravilhado (!), intrigado (?) ou reticente (...), mas nunca posso ser taxativo (.). A palavra chave no pensar teologia é talvez, pode ser, há possibilidade ...
Se o teologizar é o caminho da possibilidade com a necessidade constante de revisão das crenças, a certeza absoluta perde terreno. Instala-se o reino da possibilidade e isto foge ao conceito da religião como coleção das certezas endeusadas como absolutas, tão ao gosto das massas preguiçosas em pensar e consumidoras fáceis e contumazes de ideias alheias com tempero de absoluto.
Por outro lado, o pregador das possibilidades tem seus suores na tarefa de fazer pensar. Se hoje o sucesso de uma igreja se mede pela quantidade de gente, o pregador das possibilidades tem mais dificuldades com arrebanhar multidões. Assim, para mim, templos cheios é evidência de local das certezas absolutas e, portanto, da negação do teologizar sério.
Marcos Inhauser

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

TUDO É GRAÇA!

Há teologias e teologias.
Há quem a chame de doutrina, outros de regras.
Há quem entende de teologia e há quem pensa que entende.
A verdade é que, por pertencer a um campo de domínio geral (a religião), há muitos que se consideram teólogos, na mesma proporção em que há os que se julgam técnicos de futebol. Talvez se pudesse aplicar o ditado: “de teólogo e louco, todos temos um pouco”, ainda que, na minha experiência, tenho visto mais loucuras que teologias.
No campo da teologia, há dois grandes grupos: os teólogos conservadores que só fazem repetir o que alguns iluminados do passado disseram, acreditando que depois deles nada de novo se produziu e o que eles falaram é a nata da verdade. Tenho um amigo que foi fazer um curso de Mestrado e se matriculou em um curso de Teologia Contemporânea. O professor, PhT, começou a descrever o desenvolvimento teológico desde a patrística, chegou a Calvino e encerrou o curso. O meu amigo, indignado porque foi para um curso de teologia contemporânea, questionou o professor e este se saiu com esta pérola: “o último teólogo foi Calvino. Depois dele, só lixo”.
O outro grupo é dos que trazem “novidades”. Este se divide em dois: os que inventam novidades, sem embasamento e coerência (dente de ouro, cuspe santo, unção de Abraão, prosperidade, doença como castigo de Deus, maldição de família, G12, castigo hereditário, adoração ousada, etc.). O segundo subgrupo é dos que ousam fazer perguntas às formulações clássicas e reconhecidas e buscam novas compreensões para a fé. Neste contexto se pode mencionar a Teologia da Libertação, as Novas Cristologias, a Teologia Relacional, Teologia Feminina, Teologia Negra, Igreja Emergente, Ortodoxia Generosa, Teísmo Aberto, Teologia Quântica, etc.
Há outra forma de ver. Há duas grandes correntes de teologia: a da justiça retributiva e a da graça. A primeira tem uma multidão de seguidores. Acho que não exagero se digo que mais de 99% a seguem. A característica desta é que é sinergista: Deus faz a parte dEle e o ser humano tem que fazer a sua. Ouvi no final do ano um pregador se estender por 40 minutos pregando sobre o texto “pela graça sois salvos e isto não vem de vós, é dom de Deus” e ele enfatizava que a pessoa precisava acreditar, crer e aceitar. Era a incoerência absoluta e a negação do que o texto afirmava.
A outra afirma a graça de Deus, o favor imerecido. Não é o pagamento de algo que se faz ou se deixa de fazer, não é o agir de Deus constrangido por alguma circunstância, não é resposta à oração. É o agir motivado somente pelo amor de Deus. A primeira vê as dificuldades, os obstáculos, os períodos de trevas como sinais do castigo de Deus, em função de pecados conhecidos ou ocultos. A segunda vê em tudo a graça de Deus. No dizer de um cântico: “indo e vindo, trevas ou luz, tudo é graça, Deus me conduz”. Ainda que seja no vale da sombra da morte, a presença dEle se faz sentida e a graça se manifesta.
Não há poço que a graça não alcance, não há escuridão que a graça não ilumine, não há pecador que a graça não perdoe. Em Deus, tudo é graça!
Marcos Inhauser