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terça-feira, 3 de maio de 2011

SESSENTOU

Não leio os capítulos iniciais do livro do Gênesis no seu sentido literal e muito menos historiográfico. Vejo-o como literatura sapiencial, cheio de máximas de vida e instruções de sabedoria. Assim, há nele alguns dados interessantíssimos. No segundo relato da criação, diferentemente do primeiro, o homem foi criado só e somente depois de tudo o mais ter sido criado, Deus percebe que não é bom ele estar sozinho e decide criar a mulher. Isto me faz pensar na ação da graça de Deus: um agir imotivado, não provocado por qualquer circunstância a não ser sua própria vontade. Adão não tinha consciência de que estava só, que seria interessante ter companhia, que poderia ser uma mulher. Deus criou a mulher antes mesmo que Adão tivesse pedido, imaginado, pedido. E ele se surpreendeu com a ação da graça de Deus. Assim sou eu. Na juventude, meio apressadinho, andei pedindo a Deus uma companheira, uma esposa. Atirei para alguns lados, sem resultado. Um dia a graça de Deus se manifestou na minha vida e ele me deu a Eva da minha vida. E o que Deus me deu foi muito, mas muito melhor do que eu poderia ter imaginado, pensado, pedido. A Eva da minha vida, por causa da graça de Deus, vem colhendo anos na vida junto comigo. Se Deus me tivesse dado uma esposa que não envelhecesse, eu hoje, sessentão, estaria com uma jovenzinha sem muita experiência ao meu lado e eu, provavelmente me cansaria dela, porque seria a mesma nestes trinta e oito anos em que estamos juntos. A graça de Deus me deu uma Eva que vem amadurecendo pari passu comigo. E a cada dia eu tenho uma nova Eva ao meu lado, surpreendendo-me e fazendo-me companhia. Ela completa seus sessenta anos amanhã. Eu os completei em dezembro. Juntos passamos quase dois terços de nossas vidas nos fazendo companhia. E, sem nenhuma presunção, foram trinta e oito anos vivendo no paraíso, mais por mérito da minha Eva que meus. Tivemos filhos e não experimentamos o problema de vê-los brigando, tal como Caim e Abel. Antes, eles ajudaram a transformar a nossa casa em paraíso e se ajudam mutuamente. Nossos netos são como pérolas a adornar este paraíso. E, diferentemente da Eva original, a minha não me deu o fruto proibido para comer e pecar, antes, sempre, foi fiel para alertar-me a mim e aos nossos filhos e netos, a benção da fidelidade a Deus. A minha Eva é a manifestação diária da graça de Deus na minha vida. Agradeço a Deus e a ela a experiência diária da graça, coisa que só mais recentemente vim a entender.

LEGALMENTE ...

Dia destes estive em um restaurante e serviram caldeirada. Uma cumbuca de barro com toda sorte de frutos do mar, fervendo. Olhei e fiquei pensando quantas vezes somos iguais: um monte de coisas fervendo dentro da gente, frutos de todas as espécies. Estou assim. Ontem completei sessenta e confesso que fiquei igual a uma caldeirada, fervendo vários sentimentos que se me afloraram. De gratidão por ter chegado até aqui, mesmo depois de ter passado por dois sustos que me levaram à experiência de proximidade da morte. Um choque com contraste que me deu uma parada cardíaca e uma cirurgia que complicou e que achei que não sairia dela. De gratidão por ter vivido intensamente cada momento da vida, desfrutando das bênçãos. Por ter tido tão variadas experiências e oportunidades que meus netos não vão dizer que repito histórias. Por ter estado no ministério, de várias formas e maneiras, em um compromisso com o outro. De ansiedade porque, para mim, a vida até os dezoito anos de idade parecia ser uma subida íngreme, demorada. Quando cheguei ao topo, era descida e a sensação que tenho que sou um caminhão carregado de experiências, morro a baixo, na banguela: cada vez com mais velocidade. Muitas vezes me sinto como um avião que está voando, mas que vou tomando consciência de que a gasolina está acabando e que mais cedo ou tarde, dependendo dos ventos e das condições meteorológicas, terei que aterrissar. De indignação: por força de lei e imposição cultural, de um dia para o outro passo a ser idoso, ainda que não me sinta assim. É verdade que não me sinto um jovem de dezoito anos, mas idoso... Que raios deu na cabeça dos legisladores e dos categorizadores sociais, de que, por ter sessenta, tenho que ser visto como idoso. Pertenço a uma geração em que idoso era sinônimo de rabugice, de ranhetice. Sou da geração que viveu a mudança do paradigma do ranheta para o da melhoridade (eufemismo?). Mas acho que o que mais me incomoda é que, por força de lei, agora estou em pé de igualdade com grávidas e deficientes. De um dia para o outro, eu que pegava filas nos bancos, posso ser atendido prioritariamente. Nada mudou em mim. Ainda tenho pernas e disposição para enfrentar as filas. Mas a lei parece que acha que da meia noite de um dia para o outro, me tornei inválido. Já rodei um bocado este mundo de meu Deus e não me lembro de haver visto esta jabuticaba de dar ao idoso os privilégios que aqui nos são dados. Não me lembro de estacionamento para idosos nos EUA, China ou Europa. Não me lembro de filas especiais e caixas dedicados a este segmento. Talvez porque ali se preza e se respeita o idoso. Aqui, nem com vaga demarcada respeitam. A partir de hoje sou legalmente idoso. Sob protestos, mas desfrutando da idade.